“O voto antecipado feito pelo ex-Presidente da República de Cabo Verde, o senhor Jorge Carlos Almeida Fonseca, na Câmara Municipal da Praia, é completamente ilegal”, denuncia-se numa publicação de 25 de Novembro no Facebook que motivou dezenas de reacções e também pedidos de verificação de factos.
“Eu achei estranho, pois sei que ele não tem esse direito. Não sei o porquê que a gente do MPD [partido no Governo] encontra em si tanta diferença em relação aos outros cidadãos”, comenta um dos intervenientes, enquanto outro pede que se controle se o antigo Presidente da República não “vote outra vez”.
De referir que essa percepção de que o antigo Chefe de Estado não tem privilégios para votar antecipadamente é partilhada pela Câmara Municipal da Praia que, inicialmente, até indeferiu o requerimento de Jorge Carlos Fonseca nesse âmbito.
Tudo começou a 19 de Novembro, quando o antigo Presidente cabo-verdiano requereu junto do Presidente da Câmara Municipal da Praia o exercício antecipado do seu direito de voto, tendo para o efeito preenchido o modelo apropriado.
No seu pedido, Jorge Carlos Fonseca justificou a necessidade de votar antecipadamente por ter, na qualidade de antigo Presidente da República de Cabo Verde, sido “convidado para ser orador numa conferência internacional em Dakar, que terá lugar no dia 2 de Dezembro próximo”, sublinhando que a sua participação honra o Estado cabo-verdiano.
Entre outras explicações, referiu que aceitou o convite e marcou sua viagem para o dia mais próximo possível do evento, que deverá ser na manhã do dia 1 de Dezembro, data em que se realizam as eleições autárquicas em Cabo Verde.
Entretanto, face ao indeferimento do seu pedido pela Câmara Municipal da Praia, Jorge Carlos Fonseca interpôs um recurso no Tribunal Judicial da Comarca da Praia, tendo o referido órgão de justiça julgado procedente a providência requerida e ordenado ao Presidente da Câmara Municipal da Praia que aceite o pedido de voto antecipado do recorrente.
Na decisão, o tribunal recordou que, de acordo com o artigo 213.º do Código Eleitoral, podem votar antecipadamente os militares, os agentes das forças policiais ou dos serviços de segurança, os trabalhadores dos serviços de saúde ou da protecção civil, que até no dia da realização das eleições estejam impedidos de se deslocar à assembleia de voto por imperativo inadiável de exercício das suas funções; bem como os trabalhadores marítimos e aeronáuticos, que por força da sua actividade profissional se encontrem presumivelmente embarcados no dia da realização das eleições.
O diploma também permite o voto antecipado aos eleitores que por motivo de doença se encontrem internados em estabelecimento hospitalar; aos eleitores que se encontrem presos; os membros de mesa de assembleia de voto inscritos em assembleia de voto diferente; os candidatos inscritos em círculo diferente por que concorrem; os jornalistas deslocados para concelho diferente ou para o estrangeiro em missão de serviço.
Embora a questão dos antigos Presidentes da República não esteja claramente tipificada, o tribunal considerou que “não se pode ignorar” que existe um diploma legal, “Estatuto dos Presidentes da República cessantes”, aprovado pela Lei nº 107/IV/94, de 5 de Setembro, no qual se atribuem vários direitos aos ex-Chefes de Estado.
“[Têm direito a] passaporte diplomático e tratamento VIP nos aeroportos e portos nacionais, bem como precedência protocolar legalmente estabelecida; segurança pessoal e do seu agregado familiar assegurada pelo Estado; um secretário particular, nomeado em comissão ordinária de serviço e remunerado pelo Estado, ao nível do secretário membro do Governo, livremente escolhido pelo Presidente cessante, bem como a um Gabinete de trabalho instalado em edifício público”, lê-se na decisão do Tribunal Judicial da Comarca da Praia.
A segurança do Presidente cessante, acrescenta o tribunal, “continua a ser assegurada pelo Estado, através dos agentes das forças de segurança”, sendo que a estes são facultados a oportunidade de votarem antecipadamente no dia das eleições, caso estejam impedidos de se deslocarem à assembleia de voto, por causa do exercício de suas funções.
Em face do exposto, conclui o órgão judicial da Praia, “não se pode aceitar que a lei não atribua igual faculdade ao recorrente, que como se disse continua a merecer tratamento diferenciado, por conta do exercício de funções de suma relevância para o país”.
Reagindo à decisão a seu favor, Jorge Carlos Fonseca, depois de ter exercido o seu direito de voto, manifestou satisfação, através da sua página no Facebook.
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Avaliação do Polígrafo África: