O conclave electivo do maior partido da oposição em Angola, que deverá realizar-se no Sovsmo, em Luanda, na segunda quinzena de Novembro, tem vindo a atrair a atenção de vários sectores da sociedade, entre militantes e não militantes, que se digladiam nas redes sociais sobre quem deve liderar os destinos do partido.
Uma ala da UNITA entende que o actual presidente, Adalberto Costa Júnior, deve ser afastado da liderança e apela ao regresso de Isaías Samakuva, que liderou o partido entre 2003 e 2019.
Importa recordar que, antes do Congresso de 2019 — que elegeu Adalberto Costa Júnior —, Isaías Samakuva anunciou publicamente que não voltaria a candidatar-se. No entanto, em 2024, na sequência de aparentes divergências com a actual direcção, deixou em aberto, numa entrevista à Rádio Ecclésia, a possibilidade de regressar à liderança.
Por outro lado, há vozes dentro da UNITA que se opõem a essa hipótese, argumentando que o antigo líder já cumpriu o seu papel, manifestando total apoio a Adalberto Costa Júnior.
“Contrariamente ao que se tem dito, o doutor Isaías Samakuva não é solução para a UNITA. Mais ainda, os estatutos aprovados em 2019, com ele na presidência, não lhe permitem voltar a candidatar-se à liderança do nosso partido”, defendeu um militante, numa mensagem partilhada na rede social WhatsApp.
Também em 2024, o próprio Adalberto Costa Júnior admitiu ter dúvidas sobre a possibilidade legal de Samakuva voltar a candidatar-se, remetendo essa avaliação para os juristas do partido.
Mas, afinal, é verdade que Isaías Samakuva está estatutariamente impedido de voltar a concorrer à presidência da UNITA?
Diferentemente do que acontecia no passado, os estatutos revistos no XIII Congresso Ordinário, em 2019, passaram a estabelecer limites de mandatos. O artigo 52.º, sob a epígrafe “Mandato”, determina que “o mandato do presidente do partido tem a duração de quatro anos, sendo limitado a três mandatos, consecutivos ou interpolados”. Além disso, mantém-se a exigência de, para ser candidato, o militante ter, no mínimo, 15 anos de militância ininterrupta e ser membro da Comissão Política.
Em declarações ao Polígrafo África, o jurista Almeida Lucas Chingala lembra que Samakuva, por decisão própria, havia anunciado publicamente que não mais se recandidataria, sublinhando que essa declaração representa um compromisso moral. “Quando alguém, por sua livre e soberana vontade, decide não mais se recandidatar, essa palavra, sobretudo quando proferida no espaço público, constitui um compromisso ético e moral. E a ética, ao contrário das normas legais, não se impõe — cumpre-se por convicção”, afirma.
Contudo, do ponto de vista estritamente jurídico, Chingala esclarece que, uma vez que as limitações de mandato só foram introduzidas em 2019, após os quatro mandatos cumpridos por Samakuva, o antigo líder “tem a via aberta para voltar a candidatar-se”.
“Na boa técnica jurídica, normas que restringem direitos, como o direito de ser eleito, não têm efeitos retroactivos, salvo se houver uma disposição expressa em contrário. Portanto, os mandatos exercidos antes de 2019 não contam para este novo limite”, acrescentou o jurista, lembrando ainda que o artigo 57.º da Constituição da República de Angola impede que as leis tenham efeitos retroactivos.
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Avaliação do Polígrafo África: