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UNITA já fez parte de um “Governo com o MPLA”, como disse Abel Chivukuvuku?

Política
O que está em causa?
Alvo de suspeições de que esteja a montar engenharias políticas para vir a governar com o MPLA no quadro das eleições previstas para 2027, Abel Chivukuvuku não só rejeitou as acusações, mas também deixou transparecer a ideia de que um exercício de governação com os "camaradas" não seria um sacrilégio, ao recordar que a UNITA já governou com o MPLA em duas ocasiões. É verdade?
© Agência Lusa / Ampe Rogério

“A teoria de que podemos fazer parte do Governo com o MPLA (…), na história de Angola, houve dois exercícios mais ou menos no formato de coligação [governativa], primeiro em 1975 – o Governo de Transição. Foi feito pelo MPLA, pela UNITA e pela FNLA. E o segundo exercício foi em 1997, feito pela UNITA e pelo MPLA. Portanto, repito, em 2027 ou somos Governo ou parte do Governo”. A afirmação é de Abel Chivukuvuku, proferida durante uma conferência de imprensa que realizou para esclarecer as especulações que têm circulado de que poderá estar mancomunado com o Presidente João Lourenço, visando deixar para trás a Frente Patriótica Unida (FPU) e formar um Governo com o MPLA em 2027.

As suspeições de que Abel Chivukuvuku poderá trair os seus parceiros e os objectivos com que foi criada a FPU, plataforma política não formalizada, mas por via da qual o Bloco Democrático e o PRA-JA participaram nas eleições de 2022 endossando a lista da UNITA, intensificaram-se no presente ano de 2024, assim que o Tribunal Constitucional legalizou o então projecto político PRA-JA como partido, depois de o ter rejeitado ao longo de vários anos. Também contribuiu para essas suspeiçºoes o facto de o Presidente República João Lourenço ter designado Abel Chivukuvuku como membro do Conselho da República, além de o próprio Chivukuvuku e o seu adjunto no PRA-JA, Xavier Jaime, terem passado a assegurar – sem descurar o MPLA – que o PRA-JA será “Governo ou parte do Governo“.

Entretanto, em conferência de imprensa no dia 27 de Dezembro, além de ter reiterado que a FPU é para ser “reforçada e reformulada”, Chivukuvuku lembrou aos presentes que o PRA-JA ainda está enquadrado na referida plataforma e que se vencer as eleições em 2027, o PRA-JA “será parte do Governo”, tendo igualmente sublinhado que o maior partido na oposição em Angola já governou com o MPLA em duas ocasiões.

A última alegação tem fundamento?

Sim. De acordo com o disposto na Lei 1/75 de 30 de Janeiro, publicada em “Diário da República” em Portugal, antes da retirada total dos portugueses como força colonizadora em Angola, entrou em funções um Governo de Transição em Angola, composto pela FNLA, então liderada pelo nacionalista Álvaro Holden Roberto; pelo MPLA, encabeçado por António Agostinho Neto; bem como pela UNITA, liderado à época pelo seu fundador Jonas Malheiro Savimbi.

Como informa esta reportagem da RTP, o Governo de Transição em Angola resultou do acordo alcançado na Cimeira de Alvor (Algarve), em Portugal, tendo a FNLA, o MPLA e a UNITA indicado, para além de ministros e secretários de Estado, quadros que assumiriam de forma rotativa o cargo de Primeiro-Ministro.

No entanto, por causa das notórias divergências, o Acordo de Alvor foi decretado suspenso a 25 de Agosto de 1975, a menos de dois meses da data prevista para a realização das eleições gerais. Eclodiu a guerra já não contra Portugal, mas entre os três movimentos de libertação nacional.

Chegados a 1991, já com a FNLA bastante fragilizada, o MPLA e a UNITA assinaram, sob mediação portuguesa, os Acordos de Bicesse, que fizeram cair o sistema de partido único e uma economia centralizada em Angola, tornando o país numa democracia multipartidária e com uma economia de mercado. No âmbito desses acordos foram realizadas as primeiras eleições gerais da história angolana em 1992, cujos resultados oficiais levaram a mais um longo conflito militar.

E na tentativa de se encontrar a paz, que só veio a ser uma realidade definitiva em 2002, foi criado em 1997 o Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN), como resultado do Acordo de Lusaka.

No âmbito desse acordo, a UNITA assumiu quatro pastas ministeriais: Saúde, Geologia e Minas, Hotelaria e Turismo, Comércio. E colocou vários quadros a exercer cargos de vice-ministros, nomeadamente no Interior, Defesa, Finanças, Obras Públicas, Agricultura e Desenvolvimento Rural, entre outros.

O GURN, entretanto, foi descontinuado em Outubro de 2008, após as eleições legislativas daquele ano ganhas pelo MPLA. A extinção do referido Governo de Unidade foi proposta pelo MPLA e aprovada por unanimidade pela Assembleia Nacional.

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Avaliação do Polígrafo África:

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