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“Zenu” dos Santos pode candidatar-se à Presidência da República de Angola depois de ser indultado por João Lourenço?

Política
O que está em causa?
Filho de José Eduardo dos Santos, antigo Presidente de Angola, José Filomeno "Zenu" dos Santos foi um dos 51 condenados por crimes que beneficiaram de perdão do resto da pena através de indulto presidencial de João Lourenço, anunciado no Dia de Natal. "Assim (...) já pode tentar ser Presidente e vingar o pai", alega-se entretanto no WhatsApp. É verdade que o indulto possibilita essa suposta candidatura?
© Agência Lusa / Ampe Rogério

“Assim, com o indulto presidencial, Zenu já pode tentar ser Presidente e vingar o pai”, destaca-se numa mensagem partilhada no WhatsApp (e demais redes sociais) que está a gerar controvérsia em Angola. Refere-se a José Filomeno “Zenu” dos Santos, filho de José Eduardo dos Santos, antigo Presidente da República de Angola.

Em Agosto de 2020, “Zenu”, ex-presidente do Fundo Soberano de Angola, foi condenado – juntamente com o ex-governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Valter Filipe, o ex-funcionário sénior do BNA, Samalia Bule, e o empresário Jorge Gaudens – pelo Tribunal Supremo a penas de prisão entre cinco e oito anos, por crimes de burla por defraudação, peculato e tráfico de influências, pelo envolvimento numa transferência ilícita de 500 milhões de dólares para uma conta bancária em Londres.

Mais recentemente, a 25 de Dezembro de 2024, “Zenu” foi um dos 51 condenados que receberam um indulto presidencial de João Lourenço, actual Presidente da República de Angola. No entanto, “Zenu” remeteu no dia 6 de Janeiro uma carta ao Presidente da República a “renunciar ao indulto” que lhe foi concedido.

De acordo com a missiva a que o Polígrafo África teve acesso, ainda que não deixe de “enaltecer a decisão de indultar vários cidadãos” angolanos, “Zenu” adverte para um “equívoco legal” que terá levado à inclusão do seu nome na lista dos indultados, na medida em que não preenche “os pressupostos estabelecidos para o efeito no âmbito do Código Penal Angolano”.

De qualquer modo, é verdade que o indulto possibilitaria a candidatura de “Zenu” à Presidência da República de Angola, como se alega no WhatsApp e outras redes sociais?

Em resposta ao Polígrafo África, Serrote Hebo, jurista e director da Academia de Estudos Jurídicos e Económicos (AJEE), assegura que não.

De acordo com o Código Penal Angolano, explica Hebo, “o indulto extingue apenas a pena” e não engloba a extinção do efeito. Ou seja, a pessoa indultada pode estar em liberdade, mas as consequências do crime que cometeu continuam a vigorar.

Por exemplo, a Constituição da República de Angola determina, no seu artigo 110.º (com a epígrafe: “Elegibilidades, Inelegibilidades e Impedimentos”) que são inelegíveis ao cargo de Presidente da República – entre outros critérios ou factores – “os cidadãos que tenham sido condenados com pena de prisão superior a três anos”. Ora, o Tribunal Supremo condenou “Zenu” dos Santos a uma pena de prisão de cinco anos.

“Logo, neste quadro, é inelegível, dado que o artigo 139.º do Código Penal refere, no seu ponto 2, que a amnistia extingue o procedimento criminal e, no caso de ter havido condenação, faz cessar a execução tanto da pena e dos seus efeitos como da medida de segurança. Mas o indulto, citado no ponto 4, extingue apenas a pena, no todo ou em parte, ou substitui-a por outra mais favorável prevista na lei. O que significa que não extingue o seu efeito“, justifica Hebo.

Aliás, o próprio “Zenu” dos Santos realça na sua missiva ao Presidente João Lourenço que o indulto “tem apenas como finalidade a anulação do cumprimento da pena, sem qualquer consequência sobre os efeitos da condenação, situação que comprometeria gravemente o exercício pleno” dos seus “direitos básicos, inclusive restrições de deslocação a determinados países, cumprimentos de obrigações familiares e até mesmo o exercício de actividade profissional condigna”.

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Avaliação do Polígrafo África:

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