Repito, com a necessária adaptação, o título do texto que, em novembro de 2018, escrevi no dia que assinalou o lançamento do Polígrafo Portugal. Pareceu-me então que a combinação das expressões “Liberdade”, “Verdade” e “Inovação” formava um cocktail jornalisticamente poderoso, ao ponto de embriagar com estrondo os inimigos da democracia que diariamente, através da partilha desenfreada de desinformação no espaço público, sobretudo nas redes sociais, nos arrastavam para as trevas enquanto sociedade – e a democracia, como bem afirma o The Washington Post no seu claim, morre na escuridão.
Passados seis anos sobre o seu lançamento, o Polígrafo Portugal é um case study nacional e internacional. O nosso exemplo é exibido em liceus e universidades, tendo já dado origem a dezenas de teses académicas, entre licenciaturas, mestrados e doutoramentos. Pelo caminho, foram-nos atribuídos alguns dos mais importantes prémios jornalísticos existentes em Portugal. Os arautos da desinformação temem-nos. Os políticos, que utilizam os nossos fact-checks como armas para validar as suas opiniões durante as campanhas eleitorais, respeitam-nos. Chegam a telefonar-nos a garantir, depois de partilharem uma falsidade durante uma intervenção pública, que a vão corrigir na sua próxima aparição. E a população, aquela a quem o projecto fundamentalmente se dirige, segue-nos vorazmente – no site, nas redes sociais, na rádio e na televisão, onde, em parceria com a SIC, produzimos um programa de informação que é líder de audiências praticamente desde a primeira hora.
Como também sublinhava nesse texto, os sinais de que as democracias liberais estão em declínio acelerado são profusos. Os políticos autoritários e anti-sistema estão a ganhar terreno um pouco por todo o lado. Apelam, flamejantes, ao queimar das instituições, à cremação de políticos, juízes, jornalistas e imigrantes. O povo, por alguma razão, tem-lhes dado o apoio de que precisam para reforçarem os seus planos de destruição total. Não é preciso ser um enormíssimo especialista na obra de Hannah Arendt para identificarmos neste processo uma nova lógica de banalização do mal, desta vez alimentada pela combinação da revolução tecnológica em curso com uma geração de políticos e de cidadãos em permanente flirt com a manipulação. Regresso a Arendt: “Se toda a gente mente sempre, a consequência não é que acredites na mentira, mas que nunca mais ninguém acredite em nada.”
Falar de um mundo em que verdade e mentira não são passíveis de distinção deixou de ser um exclusivo da imaginação delirante dos autores de ficção científica. A explosão das ferramentas de inteligência artificial – que hoje permitem recriar caras, vozes e expressões humanas de forma quase perfeita – é o que faltava para a ocorrência do chamado infocalipse, o momento preciso em que realidade e ficção deixam de ter existências separadas, fundindo-se e deixando à sua passagem um rasto de descontrolo intelectual entre as populações que, em última análise, poderá resultar no fim do mundo como o conhecemos.
No dia em que o projecto Polígrafo entra em África é importante teorizar sobre estes temas. Sabemos que, à imagem do que sucede na Europa, também neste continente a desinformação ameaça as democracias. E também sabemos que estas ainda não estão suficientemente musculadas para aguentar o embate que ondas sucessivas de desinformação populista pode provocar. Neste particular, há que reconhecer que há um caminho que a generalidade da Lusofonia tem para percorrer.
O Polígrafo África entra para acrescentar, para ajudar, através de um jornalismo independente e escrutinador, a refinar as sociedades em que opera. Não gostamos deste ou daquele político, deste ou daquele partido, desta ou daquela personalidade. Somos amantes incondicionais da liberdade – liberdade que já a partir de hoje as nossas redacções nos países da lusofonia, constituídas por jornalistas locais, irão exercer alegremente com a máxima responsabilidade. É o que fazemos em Portugal; será, sem dúvidas nem hesitações, o que faremos também em África. Não faria sentido de outra forma.
Chegámos, então. E vamos ficar por muito tempo. Peço-lhe, caro leitor, que se junte a nós, partilhando os nossos fact-checks e sugerindo-nos outros para fazermos. Trabalharemos consigo em equipa. Venha, por isso, porque não estará sozinho. Garanto-lhe que em breve seremos muitos – tantos, mas tantos, que um dia será impossível enganarem-nos. Eu acredito.